Será preciso
admitir que os homens não são homens fora do ambiente social, visto que aquilo
que consideramos ser próprio deles, como o riso ou o sorriso, jamais ilumina o
rosto das crianças isoladas.
Lucien
Malson, Les Enfants Sauvages
Crianças selvagens: são
crianças que nos primeiros anos de vida viveram em completo isolamento da
sociedade ou, se estiveram em contacto com seres humanos, esse contacto foi
insignificante. A vida dessas crianças poderá equiparar-se à dos animais, já
que os seus comportamentos são em tudo semelhantes. São crianças que não falam
nem, tão pouco, se deslocam como seres humanos normais. No que diz respeito à
linguagem em concreto, elas, geralmente, apenas conhecem a mímica e os sons dos
animais, particularmente os da sua “família de acolhimento”. Quando essas
crianças regressam à sociedade, a sua capacidade para aprender uma língua varia
bastante: umas nunca vão aprender a falar, algumas irão aprender algumas
palavras e outras ainda serão capazes de aprender a falar quase corretamente,
contudo esta última situação referida apenas será possível caso a criança não
tenha estado em total isolamento humano ou, então, que já tivesse aprendido
algo antes do isolamento.
GENIE
Genie
é o pseudónimo pelo qual ficou conhecida Susan M. Wiley.
Esta
“criança selvagem” viveu praticamente os seus primeiros 13 anos em total
isolamento da sociedade, acabando por ser descoberta pelas autoridades de Los
Angeles em 1970.
Quando foi descoberta, Genie desconhecia a linguagem e obteve um
desempenho equivalente ao de uma criança de quinze meses de idade num teste
cognitivo.
Com vinte meses idade, altura em que Genie iria principiar a
aprendizagem da fala, um médico declarou que aquela criança era lenta e muito
provavelmente retardada. O pai de Genie acreditou veemente naquele diagnóstico
levando-o até ao limite. Aparentemente, com o propósito de a “proteger”, o pai
de Genie privou-a do contacto com a sociedade e a criança passou os seus dias
presa a um penico. Sempre que não era esquecida ali, à noite era posta num
berço fechado com barras de aço. É de salientar que o seu pai, todas as vezes
que Genie tentava “falar”, batia-lhe e impedia qualquer pessoa falar ou dizer
algo à criança.
Durante
todo esse período, Genie tão teve qualquer estímulo ou contacto linguístico e,
devido a este facto, ficou praticamente muda. Após a tentativa de ensino da
linguagem, ela apenas era capaz de proferir algumas palavras como “stop” e “no
more”.
Atualmente
Genie vive num abrigo para deficientes mentais, no sul da Califórnia.
VICTOR
Fraçois
Truffaut através do filme L’Enfant
Sauvage d’Averyon, em português O
Menino Selvagem de Averyon, narra a história de Victor, uma criança
sensivelmente de 12 anos de idade, que foi descoberta em 1798, por caçadores
numa floresta francesa.
A
criança acabou por ser levada para Paris, sendo examinada por Pinel, psiquiatra
mais famoso da época. Pinel considerou Victor um idiota irrecuperável. Por
outro lado, Itard, um jovem médico, era da opinião que a criança poderia
recuperar o seu atraso, uma vez que, este teria sido fruto de um isolamento
total e não por qualquer inferioridade congénita.
Apoiado na sua crença, Itard mostrou interesse neste caso e requereu a
tutela da criança. Apoiado pela sua governanta na sua casa em Batognoles, o
jovem médico tentou proceder à educação de Victor na tentativa de desenvolver
os seus sentidos e as suas capacidades intelectuais e afetivas.
Os resultados não foram totalmente satisfatórios,
mas apesar de tudo, Victor aprendeu, por exemplo, a utilizar a casa de banho,
acabou por aceitar usar vestuário humano e até conseguiu aprender a vestir-se
sozinho. Embora tenha evoluído imenso, a criança nunca foi capaz de articular
mais que um reduzido número de palavras e não mostrava qualquer interesse em
brincadeiras típicas da sua idade
Podemos concluir que Victor progrediu, mas essa
evolução não foi significativa. A criança acabou por falecer em 1828 com cerca
de quarenta anos.
Em suma, podemos concluir que há um
período crítico para a aprendizagem da linguagem. Na nossa opinião, o meio tem
um papel fundamental em determinados períodos, os chamados períodos críticos.
No que diz respeito às crianças
selvagens, a natureza forneceu-lhes a herança genética que as torna humanas, os
traços físicos e as parecenças, contudo o meio não as estimulou para se
tornarem verdadeiros seres humanos, a nível comportamental, afetivo e
cognitivo.
Para
concluir, pensamos que estas crianças são exemplo fantástico do facto de que não
basta a herança genética para nos tornarmos seres humanos.
A título de curiosidade, aqui fica um pequeno vídeo
de um exemplo de como a ficção foi buscar exemplos à realidade:
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